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A espinhosa missão do novo presidente da Petrobras


Homem-forte de FHC, conhecido como “ministro do apagão”, aceita o desafio de comandar a Petrobras, a petroleira mais endividada do mundo, que sofre com a queda das receitas e, no centro da Lava Jato, enfrenta a maior crise de imagem de sua história

No período em que ocupou o cargo de ministro-chefe da Casa Civil, entre 1999 e 2002, durante o governo Fernando Henrique Cardoso, o engenheiro carioca Pedro Parente, hoje com 63 anos, ganhou uma herança maldita: dez processos judiciais em menos de quatro anos. Vários deles acusavam Parente de, junto com a equipe econômica de FHC, ter cometido irregularidades em privatizações. Julgados improcedentes, todos foram arquivados. Em 2001, recrutado pelo então presidente tucano para comandar a Câmara de Gestão da Crise de Energia Elétrica, chamada de “Ministério do Apagão”, ele ficou famoso por ser uma espécie de pára-raios da crise energética.

“Nós precisaríamos de 20 Pedros Parentes para tocar o Brasil. É difícil mesmo”, definiu FHC, no auge da crise energética. As dores de cabeça fizeram Parente prometer à sua esposa, Lucia Hauptman, e aos três filhos, que nunca mais ocuparia um cargo público. Mudou de ideia. Convidado pelo presidente Michel Temer para assumir a Petrobras, na quinta-feira 19, Parente, com reputação de exímio gestor em tempos de crise, substituirá Aldemir Bendine na maior empresa do País.

A decisão de aceitar o convite se deu após Temer garantir autonomia e gestão técnica na companhia, dona do maior endividamento do mundo no setor de petróleo: R$ 450 bilhões. “Não haverá indicações políticas na Petrobras, o que vai facilitar muito a vida do Conselho de Administração e a minha própria”, disse Parente, no dia de indicação. “Isso foi um sinal claro que o presidente Temer me passou.” Seu nome foi bem recebido pelo mercado. “Pelo currículo, Parente está credenciado a recuperar a estatal.

Se aprovada pelo conselho, sua nomeação vai gerar um efeito positivo no valor das ações”, afirma Pedro Paulo Silveira, economista chefe da corretora Nova Futura. Seu histórico é, de fato, vitorioso. Depois de deixar o governo FHC, Parente foi vice-presidente executivo do grupo RBS, onde coordenou uma ampla reestruturação financeira. Também foi presidente do conselho da União Indústria da Cana-de-Açúcar (Unica) e presidente da Bunge. Após deixar a companhia, em 2014, criou a Prada Assessoria, consultoria financeira para gestão de fortunas.

“O desafio agora é grande. Algumas ações que Parente terá de tomar hoje podem prejudicar a geração de receita no futuro”, diz Silveira, da Nova Futura. Os números da petroleira apontam para uma situação crítica. Em 2015, a Petrobras registrou um dos maiores prejuízos da história do Brasil: R$ 34,8 bilhões. Mas há salvação. “É preciso transformar sua gestão em algo mais parecido com uma empresa privada”, afirma Paulo Gomes, economista-chefe da gestora de recursos Azimut Brasil Wealth Management.

“Infelizmente, governos passados utilizaram a petroleira como instrumento de política social e intervenção econômica.” Para Adriano Pires, diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE) e consultor na área de petróleo e gás, é fundamental que Parente tenha poder para compor uma equipe de confiança. “Desmontar o aparelhamento e influência política na empresa será um grande desafio”, diz Pires. “Um ponto importante é escolher pessoas que já tenham um diagnóstico da situação caótica, até porque ele estava afastado do setor e a Petrobras precisa de soluções rápidas.”

Além da contaminação da operação Lava Jato, as perdas do ano passado foram motivadas pela reavaliação de alguns investimentos da companhia, que sofreram forte desvalorização em função da queda do preço do petróleo – há dois anos, o barril era negociado a US$ 100, mais do que o dobro do patamar atual, entre US$ 35 e US$ 40. O Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj), por exemplo, encerrou o ano avaliado em R$ 5,2 bilhões, ante R$ 21,8 bilhões em 2014. Desconside-rando essas baixas, a empresa teria registrado um lucro de R$ 15 bilhões, de acordo com os cálculos da Nova Futura.

Mesmo com o cenário desfavorável, a Petrobras pode ser lucrativa. Atualmente, seu custo de exploração é de US$ 15,23. A margem é pequena, mas está longe de inviabilizar a empresa. O problema maior, na verdade, está na falta de capacidade de investimentos. Sem dinheiro para financiar novas frentes de geração de receita, o mais urgente, dizem os especialista consultados pela DINHEIRO, é se concentrar na venda de ativos, medida que já vinha sendo tomada por Bendine. “O caminho passa por abrir espaço para que a iniciativa privada participe mais dos investimentos", diz Gomes, da Azimut.

As operações da companhia brasileira na Argentina e no Chile, além da participação na petroquímica Braskem, são alguns dos negócios que devem ser colocados à venda. Trata-se, na linguagem do mercado, de uma espécie de “privatização fatiada”. Para Pires, do CBIE, é essencial criar mecanismos que facilitem e agilizem a capitalização da empresa no mercado. Nesse sentido, é necessário mudar a Lei do pré-sal, que obriga a Petrobras a ser sócia majoritária em todos os poços de exploração.

Por outro lado, há o risco de a empresa prejudicar seu desempenho futuramente, ao se desfazer de ativos que tenham potencial lucrativo. “Ninguém que tenha juízo comprará algo que não dá retorno”, diz Silveira, da Nova Futura. “Essa é uma receita que a companhia perderá.” A saída, nesse caso, é adotar uma postura menos imediatista, preservando investimentos diretamente ligados ao seu negócio principal, como a BR Distribuidora e a Transpetro. “O grande risco é desfazer-se de ativos valiosos por um preço que trará liquidez em curto prazo, mas que não vai resolver a alavancagem da empresa”, diz Pires.

“Nesses casos, é melhor investir na reestruturação das operações e aguardar um contexto mais propício para vendê-las.” Agora, como homem-forte do governo Temer, Parente sabe que terá uma missão espinhosa na estatal. Seu sucesso ou fracasso dependerão de fatores que não estão sob seu controle, como o preço do petróleo. Além da capacidade de gestão, ele terá de contar com uma conjuntura internacional mais favorável. Se conseguir tirar a Petrobras do poço, será um grande protagonista desse momento histórico de resgate da economia brasileira. E não precisará fazer novas promessas à família.

Fonte: Isto É Dinheiro